A caridade sempre acompanhou as primeiras comunidades cristãs. Desde o Antigo Testamento, Deus é descrito como sendo compassivo e exercendo a caridade em favor dos menos favorecidos. Esquecer esse fator determinante é perder o cerne de toda a tradição judaico-cristã. Várias são as passagens nas quais Deus é apresentado como o defensor de viúvas, órfãos e pobres. O próprio fato que deu origem a Israel, enquanto um povo, nasce da caridade divina quando, em sua infinita bondade, o Senhor se revela a Moisés: “Eu vi a humilhação de meu povo no Egito e ouvi seu clamor por causa da dureza dos feitores. Sim, eu conheço seu sofrimento” (Ex 3, 7).
Na plenitude dos tempos, a caridade divina toma um rosto humano, assume a condição frágil da humanidade e vem habitar entre nós. Jesus é a grande e insuperável solidariedade de Deus com o homem. Em seu primeiro discurso como Messias, Jesus assume a profecia de Isaías, revelando, assim, seu estilo de vida e o objetivo de sua missão: “O Espírito do Senhor está sobre mim, pois ele me ungiu para anunciar o evangelho aos pobres: enviou-me para proclamar a liberdade aos presos e, aos cegos, a visão; para pôr em liberdade os oprimidos e proclamar um ano da graça do Senhor” (Lc 4, 18-19).
Jesus se faz pobre e encarnado no meio dos pobres, ele os chama de felizes, bem-aventurados (cf. Mt 5,1) e estabelece a caridade exercida em favor deles, como fator determinante do juízo final (cf. Mt 25). Desde então, as primeiras comunidades sempre tiveram a responsabilidade de continuar o programa de missão do mestre Jesus.
A caridade cristã não se encontra na esteira do assistencialismo, mas nos caminhos da teologia. Não somos motivados por uma ideia, nem muito menos desprovidos de nossa fé, mas somos motivados por Jesus, razão de toda caridade exercida em favor dos pobres e excluídos.
O papa São Paulo VI disse, certa vez, que “os pobres são um sacramento de Deus para todos nós”, e o que é um sacramento? É um sinal eficaz, é uma realidade através da qual Deus nos toca. Compreender assim nossos irmãos, que são os lázaros dos tempos modernos, é deixar-se interpelar pela misericórdia de Deus, e não ter por invisíveis as precárias realidades que são visíveis e gritantes pelas ruas e muitas casas de nossas comunidades.
Entre a caridade e o assistencialismo, a maior é a caridade. Ser caridoso não é tornar o outro dependente, mas sim promovê-lo enquanto pessoa humana. Depois do indicativo da graça, é repetir o imperativo que os evangelistas tantas vezes colocaram na boca de Jesus: “Levanta-te, pega tua maca e vai para tua casa” (Mc 2, 11); “Levanta-te, vem para o meio” (Mc 3,3); “Menina, levanta-te” (Lc 8,54); “Levanta-te, pega tua maca e anda” (Jo 5, 8) e tantos outros exemplos que poderíamos elencar aqui.
O cristão não é assistencialista, pois não é movido por uma ideia e sim pela fé. Sabe exercer a caridade em favor do próximo, pois ele, por primeiro, foi alvo da grande caridade de Deus manifestada em Jesus de Nazaré.